Uma questão de a(l)titude



«A Choupana não é um campo fácil, tem as dimensões acertadas, o relvado é bom, mas as condições climatéricas alteram muito. Sobretudo, não há uma adaptação fácil à altitude (...) o Nacional, contra o F.C. Porto, joga muito para além das suas capacidades.»

As palavras pertencem a Jesualdo Ferreira e datam de 2007, altura em que o professor ainda era treinador do Porto e fazia assim a antevisão de mais um Nacional-Porto. Curiosamente, e numa época em que praticávamos um excelente futebol (que, como pedaço de informação, sem qualquer intenção premonitória, foi eliminado na Liga dos Campeões por um tal de Manuel Neuer), a equipa cai com estrondo na Madeira após quatro vitórias consecutivas demonstrando a veracidade das palavras de Jesualdo. Mais de sete anos volvidos, as declarações parecem ainda fazer sentido e o Porto, que minutos antes do início do jogo de sábado viu o Benfica a deixar três pontos em Vila do Conde, não conseguiu aproveitar o deslize encarnado e voltou a tropeçar diante do Nacional, apenas conseguindo trazer da Choupana um ponto que interrompe uma das melhores séries de vitórias do Porto dos últimos anos. Paira um enorme sentimento de ironia no ar ao ver que o jogo que nos dá a possibilidade de voltarmos a depender apenas de nós próprios para conseguirmos alcançar o campeonato, após quatro meses e depois da derrota diante do Benfica no Dragão, seja considerado por todos os adeptos como altamente decepcionante, e com toda a legitimidade para que o seja visto dessa forma.

Com o regresso de vários jogadores que tinham estado ausentes por lesão no jogo frente ao Arouca, o onze inicial estava relativamente próximo daquele que era esperado por parte de Julen Lopetegui. A entrada da equipa e os processos de jogo pareciam também idênticos àqueles com que nos fomos cimentando ao longo dos últimos jogos: segurança na retaguarda, subidas fortes por parte dos laterais; acompanhamento efectivo de Evandro na ala esquerda, fixando-se inclusive como extremo, algo que soube fazer de forma bastante positiva, aquando das incursões de Brahimi pelo centro do terreno; e a maior liberdade a Herrera para correr com bola em zonas mais interiores, até porque do lado direito se encontrava Tello, um jogador que não tem por hábito recorrer ao apoio do médio mais próximo.
O plano de jogo parecia bem entrosado por parte de boa parte dos jogadores, mas desde cedo se percebeu que a equipa adversária ia causar dificuldades na forma de jogar do Porto. Apesar da ausência de Marçal, habitual lateral esquerdo dos insulares, o Nacional conseguiu de forma muito positiva evitar que a bola chegasse com qualidade a Tello, fechando maioritariamente a zona do meio-campo de onde frequentemente surgem os passes em profundidade para a velocidade do extremo, impedindo assim as suas habituais arrancadas com perigo e obrigando o Porto a apostar quase de forma definitiva no ataque pela sua esquerda.
Com Alex Sandro a envolver-se muito bem no plano ofensivo, com um excelente acompanhamento e decisão/definição de passe por parte de Evandro, foi com pesar que cedo se percebeu da pouca inspiração de Brahimi no jogo, que podia facilmente ter ajudado o Porto, devido à qualidade das triangulações dos três elementos referidos a chegar à vantagem desde bem cedo.
(Tello e Aboubakar sozinhos perante a
 presença de cinco jogadores do Nacional)
Infelizmente tal não sucedeu, cedendo assim parte do alento à equipa do Nacional, que foi aproveitando para começar a subir no terreno e a segurar melhor o ímpeto ofensivo do Porto. A equipa começava assim a ter oportunidade de responder através das transições rápidas, mas foi exactamente a partir desse momento que se percebeu da enorme dificuldade que os jogadores tinham em avançar de forma rápida no relvado, tornando praticamente impossível a criação de perigo através do contra-ataque, pois apenas Tello e Aboubakar, que estava já mais fixo na frente de ataque, conseguiam chegar com facilidade a zonas mais adiantadas da defesa adversária, nunca avistando sinal algum de Evandro ou Herrera nas proximidades da grande área do Nacional.
(presença exclusiva de Aboubakar
na primeira fase de pressão)
Tais situações de clara inferioridade numérica a atacar acabaram por ditar a recuperação fácil de bola por parte dos madeirenses, que rapidamente se organizam para a saída atacante. O critério usado nem sempre era o melhor, mas devido à ausência de uma pressão inicial forte - que na verdade apenas era executada, e de forma extremamente ténue, por Aboubakar - conseguiam colocar a bola nos últimos trinta metros do terreno, obrigando o Porto a ter que reiniciar de forma frequente os processos de jogo, que demoravam mais do que o habitual a serem alcançados de forma positiva, pois Herrera e Evandro sofriam, a partir dos vinte minutos de jogo, uma intensa pressão que os tornava quase invisíveis como referências no que a linhas de passe diz respeito, obrigando a equipa a atrasar a saída para o ataque até surgir a possibilidade de passe para a zona do meio-campo, que invariavelmente era dada por Brahimi, que mesmo estando longe da qualidade exigível a nível de decisão, mostrou-se sempre a um excelente nível nesse específico aspecto.
(única linha de passe no meio-campo
era dada por Brahimi)
Quando o argelino permanecia na esquerda, Maicon e Marcano eram constantemente obrigados a procurar o passe longo, que raramente tinha resultados práticos interessantes para a equipa, apenas tornando mais acessível a recuperação de bola do Nacional, que aproveitava nesta fase para sair de forma rápida para a baliza de Helton - percebendo que desde cedo alguns jogadores do Porto acusavam as difíceis condições criadas pela altitude e que demoravam (bem) mais do que o habitual a recuperar no terreno - mesmo não apresentando grande clarividência, sobretudo devido à qualidade do jogo de Casemiro e de Maicon, essenciais no desarme. O jogo ficava assim partido, mas o Nacional conseguia com qualidade e quantidade suster bem a zona de meio-campo do Porto, que pareceu logo na primeira parte sentir a falta de Óliver, sobretudo devido à dificuldade que Evandro sentia quando tinha que procurar jogo interior. Apesar de tu
(meio-campo do Porto era rapidamente
engolido por jogadores do Nacional)
do, a intensidade de Herrera fazia com que avançássemos de forma sustentada no terreno e sempre que Evandro encontrava a sua zona de conforto, no lado esquerdo do ataque, o Porto voltava a ser extremamente perigoso, que esbarrava apenas na dificuldade de Brahimi em implementar o lado efectivo do seu estilo de jogo, que certamente em noites mais de acordo com a sua real capacidade já teria antes da meia-hora de jogo ajudado a equipa a alcançar um ou dois golos, tais eram os espaços que lhe eram apresentados. Por esta altura, o Porto aumentava o ritmo de jogo e a intensidade na pressão, na procura clara do golo antes do fim da primeira parte, que acaba por surgir devido a esse evidente cerco à área do Nacional, com um excelente trabalho de Tello a aproveitar a confusão das marcações adversárias devido às subidas de Danilo, que parecia ter sempre uma mudança a mais que qualquer outro jogador em campo.
Pelo meio, o primeiro sinal de uma preocupação que viria a fazer todo o sentido em existir, quando a
(primeiro sinal de desgaste por parte de Alex Sandro)
cinco minutos do intervalo Alex Sandro demonstra uma total incapacidade na recuperação, expondo o lado esquerdo da defesa a uma situação de ataque que por muito pouco não dá o golo do Nacional.

O Porto, apesar da necessidade em apresentar algumas cautelas, vai a vencer com toda a justiça para o intervalo, regressando com a mesma identidade e vontade de continuar por cima do jogo que já havia registado na primeira parte. É porém ao fim de poucos minutos que o treinador do Porto toma duas estranhas decisões que acabam por mudar o rumo do jogo, com a saída de Casemiro - até ao momento o elemento mais estabilizador e mais capaz de perceber os momentos de transição da equipa, sempre bem a acabar com as jogadas de perigo do Nacional em zonas mais interiores - e a entrada de Rúben Neves, aliada à imediata ordem para que Quintero, que já não era utilizado há um mês e que iria ter sempre imensas dificuldades em entrosar-se num jogo diante de uma equipa por demais agressiva no meio-campo, iniciasse os exercícios de aquecimento.
E para quem chegou a alegar que a substituição de Casemiro fazia todo o sentido por já ter um cartão amarelo (diga-se, extremamente infantil) basta registar que este foi o 12º cartão que Casemiro viu em toda a época do Porto, o 6º durante os primeiros 45 minutos, tendo anteriormente apenas saído de campo depois de ser amarelado nessas condições por duas vezes: diante do Sporting para a Taça de Portugal em que claramente estava a ser o pior elemento da equipa, tendo sido substituído por questões meramente técnicas; e em Penafiel, logo após o Porto ter assegurado uma vantagem de dois golos. E deveria ter sido exactamente essa a circunstância para que Casemiro saísse do campo, até porque a equipa entrou na segunda parte com o claro objectivo de alargar a vantagem. E bom, Casemiro nunca foi expulso no Porto.
A verdade é que durante os primeiros minutos já com Rúben Neves em campo, o Porto ainda foi capaz de atacar, com um Brahimi muito mais objectivo a largar com velocidade e critério a bola, possibilitando à equipa estar relativamente perto de fazer o segundo golo (tendo inclusive Maicon acertado na trave na cobrança de um livre directo). Um dos entraves para a falta de eficácia está directamente relacionado com Aboubakar, que demonstrou neste jogo uma enorme dificuldade a nível técnico, falhando duas recepções básicas em contra-ataques de clara superioridade numérica que poderiam ter acabado com o jogo. A partir desse momento a equipa é obrigada a recuar no terreno, sobretudo devido ao decréscimo evidente dos índices físicos.
Abdica de sair a jogar, com Helton a recorrer ao pontapé longo e começa a ter óbvias dificuldades em aguentar o meio-campo dos insulares. Manuel Machado rapidamente percebe isso, colocando mais um elemento no ataque e fazendo subir os seus laterais. As lacunas de Rúben Neves tornam-se evidentes e o Nacional toma conta do jogo, conseguindo pela esquerda criar perigo por duas vezes, em que Herrera chega atrasado para o apoio a Danilo, sendo a segunda fatal para o Porto. Alex Sandro volta a mostrar uma enorme desatenção permitindo a Wagner aparecer na cara de Helton para carimbar o empate.
Depois do golo, Lopetegui volta a recorrer a uma opção pouco convencional com a entrada de
(incapacidade de Alex Sandro em ganhar
a frente dá o golo ao Nacional)
Quintero, retirando Evandro de campo e apostando na total anarquia no sector intermédio, mesmo sabendo que Rúben Neves não tinha entrado em campo de acordo com o pretendido e que Herrera já tinha deixado no relvado todos os quilómetros que conseguiria percorrer.
Momentaneamente, a equipa sobe bem no terreno e chega a estar perto de voltar a marcar mas foi no
(Alex Sandro volta a não a conseguir recuperar devidamente,
deixando Lucas João completamente isolado)
contra-ataque dos madeirenses que se registaram os lances mais perigosos. Os jogadores do Porto subiam mas já não conseguiam recuperar para defender e foi tenebroso perceber o quão perto esteve o Nacional de chegar àquele que seria potencialmente o golo da vitória, em mais uma marcação deficiente e displicente de Alex Sandro, que Lucas João tratou de desperdiçar a menos de dois metros da linha de baliza.
A entrada de Quaresma acaba por ser uma lufada de ar fresco, mostrando uma dinâmica que os outros dois extremos simplesmente não conseguiriam alcançar. A opção de Brahimi como titular é perfeitamente perceptível, pois traz à equipa uma segurança defensiva muito superior, mas perante as substituições que retiraram qualquer tipo de possibilidade de obter ''segurança'' na defesa, Lopetegui podia perfeitamente ter apostado em Quaresma mais cedo, que com apenas quinze minutos em campo acabou por não conseguir ser decisivo, mesmo estando perto desse objectivo.

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